O erro
Fez o que tinha que fazer, como comera o que tinha que comer. As escolhas se colocavam de forma simples: o que precisa ser feito é feito, e as necessidades nascem muito facilmente no tédio e nas fugas. Fugir e entediar-se revelavam-se nestes momentos como correlatos interessantes (?) da falta de sentido: era preciso fazer algo, talvez ir a algum lugar, e logo descobrir a inutilidade e perceber o tédio de fugir o fazer ficar esperando a potencialização do novo tédio gerar nova fuga e assim sucessivamente até que as sucessões mesmas o entediassem e instaurassem o paradoxo na questão.
As descrições vão se tornando inúteis. O importante é ir demarcando a passagem do tempo pelas três refeições principais que se propunha em dias como todos os outros. Dias que explicam a invenção do calendário, em que o tempo realmente passa: pois nada acontece. Nada que pareça mais importante que as inevitáveis três refeições diárias. Tudo o que era mais importante e prioritário que estas três refeições seria facilmente adiado em função destas, mesmo que a fome fosse não mais que um sentido orgânico, e como tal altamente perecível e instável e, por que não?, o pretexto perfeito.
Precisava evitar fazer tudo o que fosse necessário, se não o fosse por imposições internas, como a fome que quase não sentia para poder senti-la sempre. Pudesse não comer nunca e encontraria todo um mundo de frivolidades obrigatórias e sentiria estes outros gostos tão insossos quanto. Em arroubos otimistas, sentir-se-ia vivo, até a hora de dormir, quando então descobriria a verdade. Mas a própria descoberta apagaria toda a sua verdade e ao acordar continuaria pensando, para passar o tempo, estar vivo.
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